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Blogueiro russo prevê golpe contra Putin e acusa Prigozhin de conspiração

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“Uma tentativa de golpe já foi anunciada. O que vai acontecer em seguida, eu não sei, principalmente porque o Wagner está sendo retirado com urgência para a retaguarda. Está claro que paira no ar um risco de golpe”.

Qualquer uma dessas palavras valeria muitos anos na cela mais profunda do sistema prisional russo, mas agora parece que está virando normal falar o que antes era indizível. Quem mencionou um golpe em formação por parte de Ievgueni Prigozhin, o sinistro e ao mesmo tempo eficiente chefe do Grupo Wagner, foi Igor Girkin.

Para facilitar, Girkin é descrito como o blogueiro militar que escreve sob o pseudônimo Strelkov e sempre dá informações importantes sobre a guerra na Ucrânia da perspectiva russa. Mas ele é muito mais do que isso. Ultranacionalista que antecipou a doutrina do “mundo russo” – toda a esfera dos antigos impérios – adotada por Vladimir Putin como justificativa histórica para invadir o vizinho, ele foi o autodeclarado ministro da Defesa de Donetsk, a região ucraniana onde parte da população russa se rebelou e agora foi anexada por Moscou.

Antes, era membro do FSB, o serviço de espionagem que Putin remodelou, mantendo a mesma essência da velha KGB. Os ucranianos acham que ele pertencia mesmo ao GRU, a inteligência militar russa. E a justiça holandesa o indiciou, in absentia, pela derrubada do avião da Air Malasia, estilhaçado por um míssil russo em 2014 quando sobrevoava a região ucraniana rebelada, um monstruoso crime que matou 298 pessoas.

Com toda essa bagagem, Girkin agora está anunciando um golpe contra Putin nos seguintes termos: “Se Prigozhin continuar a ser o chefe do Wagner, o motim acontecerá de forma rápida e radical”.

Detalhe importante: tanto Girkin quanto Prigozhin analisam a guerra de forma “extremamente negativa” para a Rússia, nas palavras do blogueiro, e defendem uma radicalização muito além dos limites da atual campanha, incluindo a total militarização do país.

“Não tenho medo de dizer que estamos caminhando para uma derrota militar”, disse Girkin.

Uma derrota, ou a percepção de uma derrota, certamente criaria o campo em que vicejariam as ameaças ao poder absoluto de Putin.

Os boatos são tantos que Prigozhin tomou uma das atitudes mais suspeitas nesse tipo de situação: negou tudo. E ainda disse que seu exército particular, considerado desde a criação como “o exército de Putin”, não tem poder suficiente para dar um golpe contra seu criador.

Muitos analistas consideram Prigozhin uma figura inaceitável para o establishment russo, um ex-criminoso de rua que cumpriu nove anos de prisão por assalto, ex-vendedor de cachorro quente que conquistou as graças de Putin – e os contratos do governo para o fornecimento de rações ao exército – quando o bajulava em seu restaurante flutuante em São Petersburgo.

Também é anotado o fato de que ele é judeu por parte de pai – e os russos estão muito longe de se comparar aos ucranianos, que elegeram presidente um comediante judeu, respeitado e aclamado pela opinião pública como um líder de dimensões heroicas pela forma como conduz a resistência a uma ameaça nada menos que existencial.

Ao desmentir que planeje um golpe – levantando, obviamente, mais suspeitas –, Prigozhin aproveitou para dizer que quem tem capacidade de fazer isso é seu grande inimigo interno, o ministro da Defesa, Serguei Shoigu, pois comanda as forças especiais do Exército. Shoigu, civil que usa farda de general por causa do cargo, é um alvo privilegiado de Prigozhin.

A facilidade com que a palavra “golpe” entrou no vocabulário corrente – embora nada disso apareça para o público geral – é especialmente espantosa se considerarmos que estamos tratando de um país onde um cidadão comum foi condenado a dez anos de cadeia por ter uma fitinha na mochila com as cores da bandeira ucraniana.

Prigozhin tem sob seu comando uma força formada por ex-militares e ex-prisioneiros comuns calculada em cerca de 50 mil homens, mesmo depois de ter sofrido 30 mil baixas, especialmente na insana batalha pelo controle de Bakhmut. A utilidade dele ficou muito clara, apesar das declarações desbocadas e ameaçadoras contra os comandantes militares – e, indiretamente, até contra Putin.

“É claro que ele não está agindo sozinho. Se estivesse, já teria sido eliminado”, disse Igor Girkin. “Ele faz parte da máfia no poder e está se movimentando”.

“Tudo que falta agora é um ataque inimigo estratégico sério. E a situação política no país pode mudar a ponto de ficar irreconhecível ainda nesse verão”.

Declarações assim fazem parte de uma armação, um jogo combinado com Putin, ou realmente representam vulnerabilidades num sistema de poder caracterizado pelo controle total e absoluto? Putin usa os “cães de guerra” para exemplificar como tudo seria pior ainda sem ele – e talvez assustar os próprios serviços de segurança sobre os quais seu poder se assenta?

O ataque com drones em Moscou no início da semana criou um ambiente de maior urgência – e a oportunidade para Prigozhin, mais uma vez, investir, no seu insuperável linguajar, contra os “traseiros gordos hidratados com cremes caros” do Ministério da Defesa.

Tem traseiros pegando fogo atualmente na Rússia – e isso que declarações como as de Prigozhin e Girkin apenas abrem estreitas janelas sobre o que realmente é dito nos bastidores de um regime que esperava conquistar um país menor e mais fraco em uma semana e agora enfrenta rumores de golpe que, por si só, já simbolizam uma derrota tremenda.

Fonte: Veja

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