Nesta sexta-feira, 11, o Prêmio Nobel da Paz de 2024 foi entregue à organização Nihon Hidankyo, grupo criado em 1956 por alguns hibakusha, como se chamam os sobreviventes e afetados pelos ataques nucleares dos Estados Unidos ao Japão no fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945.
A Confederação Japonesa de Organizações de Sofredores com as Bombas Atômicas e de Hidrogênio, nome completo da Nihon Hidankyo, foi premiada pelos seus “esforços para alcançar um mundo livre de armas nucleares e por demonstrar pelas testemunhas que armas nucleares não devem ser usadas nunca mais”.
Se hoje em dia o uso de armas nucleares é um tabu quase que universalmente condenado, parte da responsabilidade é da Nihon Hidankyo.
“Essas testemunhas históricas ajudaram a gerar e consolidar a oposição generalizada às armas nucleares ao redor do mundo contando suas histórias, criando campanhas educativas baseadas em suas experiências e emitindo alertas urgentes contra a propagação e o uso das armas nucleares”, escreveu o Comitê Norueguês do Nobel num depoimento.
O Comitê também lembrou que nenhuma arma nuclear foi usada em guerras em quase 80 anos, muito por causa dos testemunhos dos hibakusha. A atualidade do prêmio foi justificada porque “é alarmante que hoje o tabu contra o uso de armas nucleares esteja sob pressão”.
Potências nucleares estão modernizando seus arsenais, novos países demonstram interesse de comprar ogivas e conflitos estão escalando ao redor do mundo, como no Leste Europeu, entre Rússia e Ucrânia, e no Oriente Médio, com Israel bombardeando a Faixa de Gaza, o Líbano e a Síria, e com o Irã bombardeando Israel.
O número de ogivas nucleares no mundo cresceu em 2023, e um relatório da Campanha Internacional para Abolir as Armas Nucleares mostrou que todos os nove países com programas nucleares — China, Coreia do Norte, Estados Unidos, França, Índia, Israel, Paquistão, Reino Unido e Rússia — gastaram mais dinheiro com essa área em 2023.
As armas atuais são muito mais poderosas e perigosas do que as lançadas contra Hiroshima e Nagasaki em 1945.
O que é Nihon Hidankyo
O grupo começou como uma forma de pressionar o governo japonês a aumentar o apoio às vítimas dos bombardeios de Hiroshima e Nagasaki.
Desde a década de 1950, eles tentam convencer governos do mundo todo a abolir as armas nucleares ao mostrar as consequências humanitárias desses eventos.
Cicatrizes de queimaduras e uma carga radioativa que poderia causar câncer e outras doenças em longo prazo são algunmas das consequências da exposição à radiação da bomba que acompanham um hibakusha pela vida toda, além do preconceito que essas pessoas sofriam.
Segundo um estudo de 2010, cerca de 140 mil pessoas morreram em Hiroshima em 1945, quase 40% da população da cidade. No caso de Nagasaki, foram 70 mil, 28% de todos os habitantes.
Não dá para saber exatamente quantas dessas vítimas morreram na hora do impacto das bombas (algumas estimativas falam de algo entre 50 mil e 100 mil) e quantas morreram por complicações posteriores.
Muitos sobreviventes acabaram padecendo semanas ou meses depois, e vários outros precisaram carregar os sintomas da exposição à radiação pelo resto de suas vidas – algumas, infelizmente muito curtas, mas não curtas o suficiente para serem contabilizadas como mortes diretamente relacionadas aos ataques.
Estima-se que 650 mil pessoas sobreviveram aos ataques. Algumas delas entraram para associações de hibakusha e se uniram para formar a Nihon Hidankyo, que também conta com sobreviventes de testes nucleares.
Todos os anos, a confederação manda equipes para a Conferência das Nações Unidas e outros eventos para lembrar às pessoas da necessidade urgente de desarmamento nuclear. Ainda há sobreviventes que participam do grupo, mas muitas pessoas mais jovens se uniram a eles para preservar sua memória.
O co-presidente da organização, Toshiyuki Mimaki, disse em uma conferência de imprensa que o prêmio pode ser um grande força para mostrar ao mundo que “a abolição das armas nucleares pode ser alcançada”. Com 81 anos, o próprio Mimaki é um hibakusha, tendo sido exposto à radiação aos três anos de idade, em Hiroshima.
O Nobel da Paz é entregue anualmente desde 1901 para as pessoas que “fizeram o melhor trabalho pela fraternidade entre as nações, pela abolição ou redução de exércitos permanentes e pela realização e promoção de congressos de paz”. Os laureados são escolhidos pelo Comitê Norueguês do Nobel, com cinco membros escolhidos pelo Parlamento norueguês.
No ano passado, quem ganhou foi a ativista iraniana Narges Mohammadi, que luta contra a opressão das mulheres no Irã. Para conhecer melhor sua história, leia aqui.
Fonte: abril