Em 1825, visitantes do hospital St. George, em Londres, encontraram fungos e larvas sob os lençóis de um paciente com uma fratura exposta. Normal: o homem, que esperava há dias para ser atendido, não reclamou para os funcionários, que pareciam não ligar para a situação.
Casos como esse eram regra, não exceção, dos hospitais do século 19. Eram lugares escuros, sujos e mal ventilados – ideais para a proliferação de doenças. Pacientes se amontoavam em salas apertadas e, não raro, saíam dali piores do que entraram: o índice de mortalidade de cirurgias hospitalares era de três a cinco vezes maior que o de operações que aconteciam em ambientes domésticos.
Não à toa, os hospitais tinham o apelido de “casas da morte”. Alguns deles, por exemplo, só aceitavam pacientes que pudessem cobrir as despesas de um funeral, destino comum de quem dava entrada por ali. A situação era pior em grandes centros urbanos como Londres, que em 1825 se tornou a metrópole mais populosa do mundo, com 1,3 milhão de habitantes (e chegaria ao século 20 com cinco milhões de pessoas). A sujeira da cidade, consequência do crescimento desordenado, se refletia nos hospitais. Os funcionários andavam com panos sobre o nariz para se proteger do mau cheiro. E o chefe dos catadores de inseto, que tiravam pulgas e percevejos dos colchões, costumava ganhar mais que um cirurgião.
Em Londres, vários hospitais foram abertos ou ampliados na primeira metade do século 19, e houve um esforço das autoridades para mantê-los mais limpos. Mesmo assim, eles não davam conta da demanda, formada sobretudo por pessoas pobres, que não tinham dinheiro para bancar consultas em casa.
Em muitos centros de saúde, havia o dia da internação: o único momento da semana em que se admitiam novos pacientes. Era uma regra rígida, quebrada apenas quando havia um risco de vida iminente (vítimas de acidentes, por exemplo). Fora isso, os funcionários eram seletivos. Pessoas com câncer, tuberculose e infecções consideradas incuráveis eram rejeitadas.
Havia também as salas de dissecação, mais comuns em hospitais-escola, onde os cadáveres ficavam expostos (e abertos) para que os alunos pudessem estudá-los. O chão era forrado com serragem, para absorver sangue e pus. O ambiente se tornava particularmente abafado (e fedido) no inverno, quando era preciso fechar a maioria das janelas e acender a lareira.
Os médicos transitavam entre sala de dissecação e outras partes do hospital sem lavar as mãos ou usar luvas. Sequer vestiam aventais limpos: um jaleco sujo de sangue era tido como sinal de experiência; muitos residentes herdavam as vestes dos seus professores.
O resultado, claro, eram taxas altíssimas de infecções, tanto entre pacientes quanto nos próprios funcionários. Sépsis e erisipela (uma inflamação na pele) eram problemas corriqueiros, assim como ferimentos gangrenados, que acabavam em amputação. A comunidade médica sabia que os hospitais eram um problema. Mas ainda não havia uma alternativa a eles.
Em 1882, o médico alemão Robert Koch formalizou a teoria dos germes. Ele descobriu o bacilo da tuberculose, que na época era responsável por uma em cada seis mortes no mundo, e descreveu sua propagação. Os acadêmicos e a sociedade começaram a entender que microrganismos existiam, que eram responsáveis por doenças e que era possível evitá-los – e o mundo, aos poucos, ficou mais antisséptico.
Os hospitais ganharam paredes brancas, que facilitam a detecção de sujeira. Os ambientes ficaram mais arejados, com limpeza constante e um número reduzido de pacientes por quarto. Os utensílios deixaram de ter ranhuras e cabos de madeira e passaram a ser de metal, mais fáceis de esterilizar. Aos poucos, nasceram os hospitais modernos.
Consultamos os livros: Medicina dos Horrores, de Lindsey Fitzharris, Medicina Macabra, de Thomas Morris, e A Fabulosa História do Hospital, de Jean-Noël Fabiani.
Fonte: abril