Não comer carne ou qualquer outro alimento de origem animal faz parte de uma dieta vegana. Isso inclui não consumir leite, queijos, ovos e até mesmo mel.
Tamanha restrição alimentar muitas vezes é cercada de dúvidas sobre a satisfação nutricional de uma dieta assim. Será que grávidas e crianças podem ser veganas? Seguir esse tipo de alimentação é mais caro do que uma dieta onívora? É possível consumir proteína suficiente com ela?
Para início de conversa, o veganismo é um conceito que vai muito além de aspectos alimentares. Há uma preocupação com o bem-estar dos bichos, o que inclui não fazer uso de nenhum produto que contém ingrediente animal, como couro, ou que tenha sido testado em animais, como maquiagens de algumas marcas. Os veganos evitam até mesmo ir a locais que usam animais como fonte de lazer, como zoológico, aquário e circo.
Mesmo para quem ainda não chegou a esse nível de comprometimento com o bem-estar animal, é possível adotar apenas a dieta vegana, chamada, neste caso, de alimentação vegetariana estrita.
A seguir, acompanhe 10 mitos e verdades sobre veganismo.
1. Alimentação vegana é muito restritiva e cara: mito
No Brasil, há uma imensa diversidade de vegetais. Para quem opta por uma alimentação baseada no consumo de produtos naturais e integrais, o custo costuma ser mais acessível com relação aos produtos de origem animal, como leite e derivados, carne vermelha, frango e peixe.
Mas para quem não tem muito tempo para cozinhar e acaba optando por refeições prontas, o orçamento pode pesar a longo prazo. “A partir do momento que você introduz alimentos processados, começa a ficar mais caro, porque ainda são poucas as empresas que comercializam esses alimentos”, ressalta Fernanda de Luca, médica nutróloga e pediatra, presidente da ABMV (Associação Brasileira dos Médicos Vegetarianos).
Algumas dicas para baixar o custo de produtos in natura inclui escolher vegetais da época e utilizar integralmente esses alimentos, aproveitando talos, cascas, sementes, folhas e flores. Isso reduz o desperdício e aumenta o valor nutritivo da preparação.
2. É fácil perder peso sendo vegano: verdade
Isso ocorre se o vegano apostar em uma alimentação rica em produtos naturais e integrais, como legumes, verduras e frutas, que costumam ter poucas calorias, fazer volume e possuem carboidratos de boa qualidade. Mas se a alimentação abusar de produtos industrializados, principalmente os ultraprocessados, o ganho de peso será quase certo.
“Via de regra, as pessoas veganas têm um índice de massa corporal e obesidade menores do que as não veganas —e isso a gente tem documentado em vários estudos científicos. Mas um vegano também pode ser obeso, depende das escolhas alimentares”, diz Rachel Francischi, nutricionista pela USP e autora do livro “Vegetarianismo e Veganismo em Nutrição Materno-Infantil”.
3. Alimentação vegana não tem proteína suficiente: mito
Apesar de muita gente associar a proteína a fontes exclusivamente de origem animal, como carnes e leite, existem muitos vegetais ricos nesse macronutriente, principalmente as leguminosas, como feijão, lentilha, grão-de-bico, ervilha e soja.
As proteínas também podem ser encontradas em boa quantidade em cereais como arroz, milho, trigo, quinoa, cevadinha e aveia, assim como em oleaginosas como nozes, castanha-do-pará e de caju.
Francischi recomenda a ingestão, duas vezes ao dia, de uma porção generosa de leguminosas e cereais para uma boa dosagem de proteínas. “Gestantes e atletas costumam ter uma necessidade maior e precisam consumir cerca de três vezes ao dia”, complementa.
4. Veganos não conseguem obter nutrientes e vitaminas suficientes: mito
“Alimentos de origem vegetal podem suprir as nossas necessidades diárias de nutrientes: carboidratos, proteínas, gorduras, vitaminas, minerais e fitoquímicos. Mas os alimentos utilizados precisam estar equilibrados quimicamente e serem, na sua maioria, consumidos in natura ou minimamente processados”, aconselha Jailma Santos Monteiro, professora do departamento de nutrição da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).
Uma das grandes preocupações para quem opta pela dieta vegana está no consumo adequado de ferro, mas ele pode ser encontrado em grande quantidade em lentilhas, feijões, tofu, espinafre e quinoa. Embora tenha uma absorção menor que o ferro de origem animal, ele pode ser otimizado com a combinação de alimentos ricos em vitamina C, presente em grandes quantidades na acerola, caju e goiaba.
Porém, a suplementação do ferro pode ser necessária em casos de baixos níveis de ferritina e/ou anemia, especialmente em mulheres em idade fértil que menstruam.
Até mesmo o cálcio pode ser encontrado em abundância em vegetais como repolho, brócolis e couve, além de tofu, leites vegetais fortificados, amêndoas, sementes de chia e gergelim, feijão e outras leguminosas.
5. Não é possível encontrar vitamina B12 em alimentos vegetais: verdade
Essa vitamina tão importante para o funcionamento neurológico também é essencial para a formação das células sanguíneas e para o metabolismo das proteínas e dos carboidratos dos alimentos, ajudando a manter uma boa disposição física e mental.
Ela é encontrada normalmente em alimentos de origem animal, como ovos, leite, fígado, peixe e frango. Por isso, no caso de veganos, essa vitamina precisa ser suplementada.
Profissionais também orientam fazer um exame de sangue para acompanhar o índice do nutriente no organismo e saber quanto suplementar.
6. Veganos sentem fome mais rápido: verdade
Isso acontece porque os alimentos vegetais são digeridos muito mais rapidamente do que a carne, que leva em torno de 8 horas. O peixe leva 4 horas e o frango, 6 horas. Já uma fruta leva em torno de 40 minutos. Verduras, legumes e leguminosas, em torno de 2 horas.
“Alimentos vegetais têm pouco teor de gordura, que lentifica o esvaziamento gástrico. Já as carnes tendem a apresentar um grande teor de gorduras, o que faz com que a pessoa se sinta saciada por um tempo maior”, explica a nutróloga Fernanda de Luca.
Por outro lado, é uma dieta riquíssima em fibras, um grupo de nutrientes que traz bastante saciedade, que segura a fome por um tempo maior.
“Não dá para generalizar. A saciedade é individual e vai depender de vários fatores, como o consumo na refeição anterior, atividade física, estresse térmico e questões emocionais. Tudo isso interfere nos sinais de fome e saciedade”, diz a nutricionista Rachel Francischi.
7. Você não pode ser vegano durante a gravidez: mito
Tanto gestantes, quanto lactantes podem adotar uma dieta vegana, mas isso vai demandar um planejamento, por ser um período de intensa vulnerabilidade nutricional e altas demandas.
“Nesse grupo, em especial a gente vai tomar muito cuidado com a vitamina B12, porque ela é fundamental para o sistema neurológico, para o desenvolvimento do feto e para a multiplicação celular. E cuidados especiais com nutrientes críticos nessa fase da vida, como o ômega 3”, ressalta Francischi.
Também é importante consumir uma quantidade maior de proteínas, e caso isso não seja possível a partir de leguminosas e cereais, será preciso suplementar, assim como cálcio e ferro.
“Nessa condição, as mulheres devem ter uma orientação profissional, tanto veganas quanto não veganas, para que seja garantido um aporte de nutrientes adequado às necessidades especiais dessa fase”, aconselha a nutricionista Jailma Santos Monteiro.
8. Também existe junk food em alimentação vegana: verdade
Não só de alimentos naturais e integrais vive um vegano. Muitas vezes bate aquele desejo de algo mais calórico e muitos acabam cedendo a comidas processadas ou mesmo aos ultraprocessados, como hambúrger, salsicha, doces e queijo veganos. Esses alimentos possuem baixa qualidade nutricional e são muito calóricos, podendo levar à obesidade e doenças cardiovasculares.
A gente pode ser vegano consumindo batata frita, refrigerante e um monte de biscoito. Uma dieta vegana não é por si só saudável, depende das escolhas alimentares, da forma de preparo dos alimentos e se estarão adequados nutricionalmente ou não. Rachel Francischi, nutricionista
9. Crianças não podem ser veganas: mito
Nos primeiros seis meses, a recomendação é o aleitamento materno exclusivo, que fornece todas as proteínas, ômegas e vitaminas que o bebê precisa, além de água e fatores imunológicos. “O leite de uma mãe vegana é tão nutritivo quando de uma não vegana, desde que ela esteja suplementada com a vitamina B12 e tendo uma alimentação balanceada”, ressalta Francischi.
Depois dos seis meses de vida, a introdução de alimentação sólida pode ser vegana, desde que bem equilibrada quanto a leguminosas, cereais e que tenha um bom aporte de gorduras saudáveis, como abacate, azeite, óleos vegetais e oleaginosas na forma de pasta ou raladas. A suplementação da vitamina B12 para a criança também é muito importante.
10. É possível ganhar massa muscular sendo vegano: verdade
As proteínas vegetais são tão boas e eficientes quanto as proteínas animais no quesito ganho de massa muscular. “Estudos que comparam a proteína de soja, por exemplo, com o whey protein, que é de origem animal, mostram que o ganho de massa muscular depende da quantidade de proteína ingerida, e não da sua origem”, reforça de Luca.
A médica ainda complementa que há outros benefícios que vêm da proteína de origem vegetal, como antioxidantes, fitoquímicos, fibras, vitaminas e minerais.
Fonte: uol