Um filme feito única e exclusivamente da realidade. Assim poderíamos definir O Debate, que marca a estreia do ator Caio Blat como diretor de cinema. Baseado em uma peça de teatro escrita pelos consagrados Guel Arraes e Jorge Furtado, o longa-metragem trata dos assuntos mais latentes no Brasil de hoje a partir da perspectiva de um casal de jornalistas recém-separados, interpretados por Débora Bloch e Paulo Betti. A princípio soa panfletário, mas é uma tentativa de resgatar a base de qualquer diálogo: a verdade.
A história se passa nos corredores – e sobretudo no terraço – de uma emissora de TV no Rio de Janeiro. A correria do dia tem um motivo: o debate com os candidatos à presidência vai começar em breve. É um evento decisivo para um país que perdeu quase 700 mil vidas durante a pandemia de Covid-19.
É também o momento em que Paula, âncora do telejornal noturno, e Marcos, seu editor-chefe e ex-marido, travam um embate ético, moral e ideológico sobre o papel do jornalismo. O divórcio depois de 17 anos juntos dá um tempero extra às discussões acaloradas que a dupla tem enquanto fuma nos intervalos do debate. Afinal, eles ainda se amam profundamente, porém divergem sobre temas como monogamia, sexo, desejo, ciúme e liberdade.
“Nós dois fomos convidados em cima da hora”, conta Débora em entrevista ao AdoroCinema (assista ao vídeo na íntegra clicando aqui). “Não éramos nós que íamos fazer o filme, e sim Andréa Beltrão e Marcos Caruso. De repente, o Caio me liga e fala: ‘Vou te fazer uma proposta muito louca, a gente começa a filmar daqui a uma semana, e eu queria te chamar para fazer.'”
Débora leu o roteiro e topou de cara. No entanto, havia dois entraves: o primeiro é que ela estava com a agenda cheia devido às gravações da nova novela das 6 da Globo, Mar do Sertão; o segundo é que o filme se apoia integralmente na dinâmica entre sua personagem e a de Paulo, com diálogos extensos a serem decorados em tempo recorde.
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Paulo, por sua vez, foi uma das primeiras pessoas a ler a peça, desenvolvida por Guel e Jorge justamente durante a quarentena. “Quando soube que iam fazer o filme e que eu não estava no elenco, pensei: ‘Caraca, esse papel é para mim'”, confessa o ator. “Todo mundo entendeu a necessidade de se fazer esse filme. Todo lugar em que eu falo do filme, as pessoas dizem: ‘Legal que esteja sendo feito.’ E para mim é uma novidade lançar um filme um mês depois de rodá-lo.”
No fim, deu tudo certo – e Débora não poderia estar mais contente por ter participado do projeto. “É difícil achar um papel tão interessante e que traga uma mulher moderna, empoderada, com ideias diferenciadas. É ela que quer quebrar as regras, que toma as atitudes mais corajosas. E fala sobre muitos assuntos importantes, como o aborto e a vontade ou não de ser mãe”, analisa a atriz.
O Debate não cita nomes nem mostra os rostos dos candidatos, mas qualquer brasileiro reconhece imediatamente de quem se trata. Um deles, de extrema direita e atual presidente, não compareceu a nenhum debate no primeiro turno e está quase empatado com o concorrente da esquerda. Agora, com grande número de eleitores ainda indecisos às vésperas do segundo turno, o encontro dos adversários na telinha ganha uma importância ainda maior.
“O diálogo no Brasil se rompeu porque perdemos a base principal: a verdade. Viramos um país de negacionistas e fake news”, reflete Caio Blat. “O elogio da informação verificada, bem analisada, da ética… Isso é um assunto primordial, é pré-político. Primeiro temos que acreditar no jornalismo, defender a liberdade, a ciência, a vacina, para depois falarmos sobre questões como fome, educação e meio ambiente.”
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Ao mesmo tempo que aponta a relevância dos jornalistas na construção de uma consciência coletiva, cidadã e embasada em fatos, o filme coloca em xeque a “imparcialidade jornalística”. Cabe a esses profissionais apenas transmitir a informação e deixar que o público faça seus próprios julgamentos? Cabe a eles se recolher ao posto único de “emissor da mensagem” mesmo quando o governo é criminoso?
São questões que O Debate levanta por meio da troca de ideias entre Paula e Marcos, uma âncora e um editor-chefe. “Foi um pouco de inveja. Inveja que temos dos jornalistas, que podem escrever e botar no ar todo dia”, admite Jorge Furtado sobre a escolha dos protagonistas.
Quanto aos inúmeros temas abordados – armamento, corrupção, saúde, direitos das mulheres, meio ambiente, entre outros –, o corroteirista afirma que o maior deles é a vacina. “Nós temos um presidente que não se vacinou, que foi contra o tempo inteiro, que disse que as pessoas iam virar jacaré, que associou com a AIDS. Não dava para ficar quieto”, dispara.
E Guel Arraes concorda, acrescentando que ter um líder negacionista no meio de uma crise sanitária mundial foi uma “conjunção astral raríssima”. Ele lembra ainda que, durante o confinamento, os contadores de histórias não tinham onde contá-las nem como produzi-las. “Os jornalistas eram os únicos que estavam narrando as verdadeiras histórias no Brasil, que não pararam. É como se quiséssemos ser um pouco como eles”, brinca.
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Por fim, Caio reforça que amor e política – seus temas preferidos – devem caminhar lado a lado, e não em campos opostos. Segundo ele, essa é a chave de uma potencial mudança. “Por mais que discordemos, somos um país, vamos continuar vivendo juntos e decidindo tudo juntos – os impostos que pagamos, as leis que seguimos”, observa o diretor.
“Então, o casal Paula e Marcos vira uma metáfora do Brasil, que está rachado, separado, mas que está tentando imaginar uma possibilidade de conciliação, de conviver discordando, de respeitar a opinião alheia. O amor é extremamente político nesse sentido”, complementa Caio.
Quer saber o que mais o elenco e a equipe revelaram? Confira a entrevista completa do AdoroCinema clicando aqui ou dando play a seguir. E não deixe de prestigiar O Debate nos cinemas!