Urano e Netuno são os planetas do Sistema Solar mais distantes do Sol, e também os mais misteriosos. Um dos enigmas envolvendo os dois gigantes gelados é a configuração de seus campos magnéticos, que são diferentes de todos os outros planetas vizinhos.
Quando a missão Voyager 2, da Nasa, passou por perto de Urano, a sonda percebeu um campo magnético peculiar no planeta.
Para fins de comparação, o campo magnético da Terra se origina no núcleo e produz uma distinção bem clara entre polo sul e polo norte, chamada de “dipolo”. A maioria dos planetas do sistema solar funciona assim – menos os gigantes gelados.
Em Urano, o campo é bastante assimétrico, sem seguir o eixo planetário – e sua força varia drasticamente ao longo da superfície do planeta.
Três anos depois, a mesma missão passou por Netuno, e também encontrou um campo magnético bastante anormal.
Não sabemos exatamente o porquê dessas anomalias. Uma hipótese para resolver o problema, divulgada no começo do mês e explicada em detalhes aqui na Super, afirma que as medições realizadas pela Nasa aconteceram num momento anômalo, o que explicaria os resultados estranhos.
Agora, uma nova hipótese foi divulgada, usando simulações do interior dos dois planetas. Os resultados sugerem que as anomalias podem ser resultados de um oceano subterrâneo gigante, de mais de 8000 km de extensão, em cada um dos planetas.
Quem desenvolveu a ideia foi Burkhard Militzer, cientista planetário da Universidade da Califórnia em Berkeley, nos Estados Unidos. Sua pesquisa descrevendo a hipótese foi publicada no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences.
Água e óleo não se misturam
Urano e Netuno são gigantes gelados. Diferentemente de seus vizinhos gigantes gasosos – Saturno e Júpiter, que compostos principalmente de hélio e hidrogênio –, esses planetas são constituídos de gases um pouco mais pesados, como oxigênio, carbono, nitrogênio e enxofre. Eles são gelados porque os gases que os compõem estavam frios quando foram incorporados aos planetas – ou congelados, ou aprisionados em gelo de água.
Não se sabe praticamente nada sobre o interior desses planetas, então a nova hipótese é empolgante. Ela é baseada em uma simulação do movimento realizada por Militzer para modelar o interior dos dois gigantes gelados. A simulação prevê algo que se parece com um oceano de água, com hidrogênio e alta condutividade, importante para o campo magnético.
Os possíveis oceanos de Urano e Netuno estão sob uma pressão cerca de 60 mil vezes maior do que a pressão atmosférica que atua nos oceanos terrestres. Por isso, eles se comportariam como chamados fluidos supercríticos – um misto de gás e líquido, sem distinção certa entre as fases.
Esses oceanos indecisos estariam separados, como água e óleo, de uma camada rica em carbono, que fica entre a camada de água e o núcleo dos planetas. Em Urano, o núcleo tem mais ou menos o tamanho de Mercúrio. Em Netuno, o núcleo chega perto do tamanho de Marte.
Antes dessa hipótese, os cientistas imaginavam que os interiores dos planetas seriam mais mistos, sem as duas fases divididas tão claramente que aparecem na simulação de Militzer. No modelo computacional do cientista, os planetas também apresentam campos magnéticos assimétricos. Ou seja: essa camada de água, exclusividade dos gigantes gelados, seria a responsável por bagunçar os campos magnéticos dos planetas.
Para comprovar a hipótese, uma nova visita aos gigantes gelados precisa acontecer. A Nasa tem planos de visitar Urano, mas a missão provavelmente só será lançada em 2034, quando um alinhamento planetário entre Netuno, Urano e Júpiter vai criar um estilingue gravitacional para acelerar a viagem.
Fonte: abril