Você já deve ter ouvido falar em animais que engordam antes do inverno, estocando gordura e reduzindo o funcionamento do metabolismo para aguentar os tempos de escassez. Mas e o contrário: um animal que encolhe para enfrentar o frio?
Conheça o Sorex araneus, um pequeno mamífero nativo do norte da Europa conhecido como musaranho-comum ou musaranho-da-eurásia (e que, apesar da aparência, não é um roedor). Como sua expectativa de vida é de apenas um ano, o pobre não tem tempo a perder e não pode desperdiçar meses preciosos hibernando, como os outros animais.
A espécie tem uma estratégia muito diferente para sobreviver aos dias escuros e frios: eles encolhem seus órgãos que mais consomem combustível para conservar as poucas reservas que têm à mão. O mecanismo foi nomeado como Fenômeno de Dehnel, em homenagem ao zoólogo polonês August Dehnel.
A diferença, em valores absolutos, é pequena: o animal pode perder entre 5 e 12 gramas quando começa a esfriar. Mas, como o bicho é pequenino, esse valor representa até 18% do seu peso, sendo que a proporção é ainda maior na massa cerebral. O musaranho chega a perder 25% da massa do cérebro, mas é capaz de recompô-la na chegada da primavera.
Agora, pesquisadores dos EUA, da Alemanha e da Dinamarca identificaram vários genes responsáveis pelo fenômeno. Em um texto publicado na revista eLife, eles apontam que alguns dos genes que codificam a adaptação no musaranho são relacionados ao desenvolvimento e progressão de doenças neurológicas e metabólicas humanas.
A ativação desses genes nos musaranhos é regida pelo hipotálamo. Ele regula o metabolismo e responde às mudanças sazonais, ajustando a expressão gênica para conservar energia durante o inverno. Entender esses mecanismos pode ser importante para pesquisas de saúde humana sobre neuroplasticidade e doenças degenerativas.
Há apenas um ano, os mesmos pesquisadores descreveram uma série de mudanças metabólicas no fígado, no córtex cerebral e no hipocampo do musaranho que acompanham o encolhimento sazonal, descobertas que, segundo eles, poderiam ter implicações no tratamento de doenças neurológicas em humanos.
Ambos os textos, vale ressaltar, são preprints, ou seja, ainda não passaram pela revisão e comentários de outros pesquisadores especialistas no assunto.
“Geramos um conjunto de dados exclusivo, com o qual pudemos comparar o hipotálamo do musaranho entre estações e espécies”, disse o biólogo William Thomas, um dos principais cientistas do estudo, em entrevista ao ScienceAlert. “Descobrimos um conjunto de genes que mudam ao longo das estações e que estão envolvidos na regulação da homeostase energética, bem como genes que regulam a morte celular que, segundo nossa hipótese, podem estar associados a reduções no tamanho do cérebro.”
Fonte: abril