📝RESUMO DA MATÉRIA

  • Uma nova pesquisa mostra que a suplementação de folato durante a gravidez ajuda a proteger contra os efeitos neurotóxicos do chumbo e a reduzir comportamentos associados ao autismo em crianças expostas ao chumbo durante a gestação.
  • Embora os suplementos de ácido fólico sintético sejam seguros quando consumidos na dose recomendada, a ingestão excessiva e regular (acima de 1 mg por dia) pode ser prejudicial. O folato natural de alimentos como folhas verdes é mais seguro
  • Estudos apontam que altos níveis de ácido fólico combinados com deficiência de vitamina B12 prejudicam o desenvolvimento cerebral, afetando o crescimento neural e a formação de redes em cérebros que ainda estão se desenvolvendo.
  • Uma em cada três crianças no mundo apresenta níveis perigosos de chumbo no sangue acima de 5 microgramas por decilitro, o que resulta em redução do QI, diminuição da capacidade de atenção e danos a órgãos.
  • Reduza sua exposição ao chumbo verificando se há tinta com chumbo em casa, instalando filtros de água, evitando produtos contaminados e realizando testes dos níveis de chumbo no sangue com regularidade.

🩺Por Dr. Mercola

O folato (vitamina B9) é um nutriente essencial durante a gravidez; na verdade, mulheres que desejam engravidar são orientadas a consumir folato suficiente antes mesmo da concepção. Ele é essencial para o desenvolvimento do cérebro e da coluna, ajudando a reduzir o risco de defeitos congênitos.

No entanto, novas pesquisas explicam por que é importante ingerir folato suficiente durante a gravidez. Além de mitigar os efeitos tóxicos do chumbo, ele também reduz comportamentos associados ao autismo em crianças.

O folato ajuda a proteger contra os efeitos neurotóxicos do chumbo

Um estudo de outubro de 2024, publicado no periódico Environmental Health Perspectives, revelou que a suplementação de ácido fólico, uma versão sintética do folato, durante a gravidez ajuda a mitigar os efeitos neurotóxicos do chumbo.

Pesquisadores da Simon Fraser University usaram dados de um estudo canadense de coorte sobre gravidez e nascimento, chamado Maternal-Infant Research on Environmental Chemicals study, realizado entre 2008 e 2011. Segundo os pesquisadores:

“Medimos os BLLs [níveis de chumbo no sangue] e as concentrações totais de folato no plasma durante o primeiro e o terceiro trimestres da gravidez. Também estimamos a suplementação gestacional de ácido fólico por meio de pesquisas e genotipamos o polimorfismo de nucleotídeo único (SNP) MTHFR 677C>T materno”.

Utilizando a Escala de Responsividade Social (SRS), uma ferramenta que identifica comportamentos associados ao autismo, os pesquisadores avaliaram crianças de 3 e 4 anos nascidas dessas mulheres. Quanto maior a pontuação na SRS, mais comportamentos associados ao autismo foram identificados.

Eles descobriram que mulheres grávidas que não consumiram a quantidade recomendada de folato apresentavam níveis mais altos de chumbo no sangue e tinham filhos com pontuações maiores na SRS, ou seja, com mais comportamentos autistas, durante os primeiros anos de vida.

“A relação entre a exposição ao chumbo durante a gestação e comportamentos associados ao autismo em crianças em idade pré-escolar foi mais forte quando as concentrações totais de folato no plasma gestacional ou a suplementação de ácido fólico foram menores”, disseram os autores do estudo.

“Os benefícios da suplementação pré-natal de ácido fólico para reduzir o risco de defeitos do tubo neural são bem documentados, e nossos resultados sugerem que a suplementação durante a gravidez pode oferecer benefícios adicionais na mitigação dos efeitos da exposição ao chumbo”.

A ligação entre o autismo e a exposição a metais pesados tóxicos e pesticidas já havia sido documentada em estudos anteriores. Durante a gravidez, os efeitos desses produtos químicos perigosos tendem a ser mais intensos quando a gestante apresenta níveis insuficientes de folato no organismo.

“Nosso trabalho se baseia em um conjunto de pesquisas que indicam que o folato pode ser útil para mitigar os efeitos neurotóxicos de produtos químicos”, concluíram os pesquisadores.

Folato e ácido fólico: qual é a diferença?

Observe que o estudo em questão utilizou ácido fólico, que é bem diferente do folato. O folato é o nutriente encontrado naturalmente em alimentos integrais, como vegetais de folhas verde-escuras, frutas, feijão e ervilha. Por outro lado, o ácido fólico é uma forma sintética de folato. Ele é encontrado em muitas vitaminas pré-natais e alimentos fortificados, como massas, pães, fubá, arroz e cereais.

A orientação de tomar suplementos de ácido fólico começou no início da década de 1990, quando autoridades de saúde dos EUA sugeriram que as mulheres consumissem 400 microgramas de ácido fólico para reduzir o risco de defeitos do tubo neural em bebês.

Entretanto, como o tubo neural se fecha logo no início da gravidez, cerca de 28 dias após a concepção, algumas mulheres deixam passar o período em que o folato é essencial. Por isso, a Food and Drug Administration (FDA) dos EUA começou a fortificar alimentos com ácido fólico em 1998.

Embora não haja riscos associados ao consumo excessivo de folato de fontes naturais, o mesmo não pode ser dito do ácido fólico, já que quantidades excessivas desse nutriente sintético podem ser prejudiciais.

A suplementação elevada de ácido fólico não oferece benefícios adicionais

Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA afirmam que a suplementação de ácido fólico ajudou a reduzir os casos de defeitos do tubo neural (DTNs) em bebês, dizendo que “Desde o início da fortificação obrigatória, em 1998, cerca de 1.300 bebês que poderiam ter sido afetados nascem a cada ano sem DTNs”.

Apesar da redução nos defeitos do tubo neural, outras doenças têm apresentado aumento. O estudo em destaque também aborda essa questão, afirmando que a suplementação elevada de ácido fólico, ou mais de 1 miligrama por dia, não traz benefícios adicionais.

Na verdade, descobriram que as mulheres com os níveis mais altos de ácido fólico apresentaram uma relação um pouco mais forte entre os níveis de chumbo no sangue durante o primeiro trimestre e os comportamentos associados ao autismo nos filhos. Isso mostra que, no caso desse suplemento, mais não quer dizer melhor, e pode até ser perigoso. 

Ácido fólico demais prejudica o desenvolvimento cerebral

Em 2023, pesquisadores da UC Davis realizaram um estudo com animais e descobriram que o consumo excessivo de ácido fólico, combinado com deficiência de vitamina B12, leva a riscos ao desenvolvimento neurológico. Ralph Green, professor do Department of Pathology and Laboratory da UC Davis e um dos autores do estudo, afirmou:

“Não há dúvida de que a introdução da fortificação alimentar com ácido fólico foi benéfica, reduzindo bastante a incidência de defeitos do tubo neural. Contudo, ácido fólico demais pode ter impactos negativos no desenvolvimento cerebral, e isso é algo que precisamos entender melhor”.

Publicado no periódico Communications Biology, o estudo analisou como esses dois micronutrientes influenciam o desenvolvimento cerebral nos participantes do teste. Os pesquisadores dividiram os participantes em cinco grupos: um grupo controle, um grupo com ácido fólico alto, um grupo com baixos níveis de B12, um grupo com ácido fólico alto + baixos níveis de B12 e outro grupo que recebeu uma forma diferente de suplemento de folato.

Eles descobriram que os grupos com ácido fólico alto, baixos níveis de vitamina B12 ou ambos apresentaram alterações mais significativas no desenvolvimento cerebral. Em um comunicado da UC Davis, Konstantinos Zarbalis, professor de patologia e medicina laboratorial e coautor sênior do estudo, disse:

“Em níveis elevados de ácido fólico ou deficiência de vitamina B12, ocorreram alterações no desenvolvimento neural. Os neurônios corticais, que costumam surgir em estágios mais tardios do desenvolvimento cerebral, foram produzidos por um período mais longo e levaram mais tempo para se estabelecerem e assumirem sua posição correta no cérebro em desenvolvimento. Além disso, tanto o excesso de ácido fólico quanto a deficiência de vitamina B12 parecem reduzir o número de interconexões desenvolvidas pelos neurônios”.

Em resumo, altos níveis de folato e baixos níveis de B12 afetaram o crescimento e a formação de redes nas células cerebrais. Os pesquisadores destacaram que, apesar das diferenças entre modelos animais e humanos, suas descobertas podem esclarecer como esses dois nutrientes afetam a biologia humana.

“Nossas descobertas indicam riscos ao neurodesenvolvimento associados à insuficiência de vitamina B12 durante a gestação, em especial quando combinada a ingestão de altos níveis de ácido fólico, sugerindo que o processo de neurodesenvolvimento é sensível ao desequilíbrio desses micronutrientes em interação”.

Opte pelo folato natural

O interessante é que o estudo com animais envolveu outro tipo de suplemento de folato: ácido folínico, ou 5-formiltetraidrofolato (5-FTHF). Esse suplemento natural de folato não causou efeitos adversos no cérebro dos participantes do teste, mesmo quando administrado em dosagem igual a do ácido fólico.

“Substituir altas quantidades de ácido fólico por altas quantidades de 5-FTHF não causa alterações no neurodesenvolvimento e resulta em mudanças metabólicas mais brandas no ciclo do folato”, disseram os autores.

Talvez a explicação para isso seja que o ácido folínico é uma forma natural de folato presente nos alimentos. Quando ingerido, ele é convertido em outras formas ativas de folato. Isso destaca a importância de obter folato de fontes naturais, e a melhor forma de alcançar isso é aumentar o consumo de alimentos ricos em folato, como:

Aspargo

Couve-de-bruxelas

Brócolis

Espinafre

Outros vegetais de folhas verde-escuras

Ervilha

Feijão

Banana

Limão

Laranja

Melão

Morango

Além disso, você deve aumentar os níveis de vitamina B12, encontrada quase de forma exclusiva em alimentos de origem animal. Recomendo a leitura do meu artigo, “Vitamin B12 Is Key for Optimal Tissue Regeneration“, para dicas sobre como melhorar seus níveis de vitamina B12.

1 em cada 3 crianças hoje apresenta altos níveis de chumbo

No estudo em questão, os pesquisadores apontaram os riscos da exposição ao chumbo, afirmando que, embora ela esteja diminuindo, ainda não há um limite ou nível seguro.

E ainda, um número significativo de crianças hoje (1 em cada 3) apresenta níveis perigosamente altos de chumbo no sangue, acima de 5 microgramas por decilitro (ug/dL). Um relatório da UNICEF e da Pure Earth também ressaltou que crianças em todo o mundo estão sofrendo intoxicação por chumbo em uma “escala massiva e até então desconhecida”.

Isso é preocupante, pois o chumbo é uma neurotoxina poderosa. Ele está associado à redução do QI, à diminuição da capacidade de atenção e até mesmo a um risco maior de comportamento violento e criminoso na vida adulta.

O chumbo também prejudica outros órgãos, como o coração, os pulmões, os rins e o sistema nervoso. Crianças com menos de 5 anos correm o maior risco de sofrer os efeitos do chumbo ao longo da vida e, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), até mesmo concentrações baixas de chumbo no sangue, como 3,5 ug/dL, podem causar impactos comportamentais e neurológicos.

Estratégias para reduzir sua exposição ao chumbo

Considerando os efeitos graves dessa neurotoxina, fica evidente que é necessário tomar medidas para reduzir sua exposição e a de seus filhos ao chumbo. Você precisa conhecer as fontes comuns de chumbo para reduzir sua exposição, ainda mais se estiver grávida ou planeja engravidar. Considere estas estratégias:

• Verifique se há tinta com chumbo em sua casa: se sua casa foi construída antes de 1978, solicite uma inspeção para identificar tintas à base de chumbo. É preciso um profissional certificado para isso, pois seu pó é bastante tóxico. Veja o “Lead-Based Paint Resources” da EPA dos EUA21 para mais informações.

• Faça um teste de água: milhões de tubulações de água antigas nos EUA são feitas de chumbo e podem estar trazendo água contaminada para sua casa todos os dias. Recomendo instalar um filtro de água de alta qualidade que seja capaz de remover chumbo para toda a casa.

O ideal é filtrar a água no ponto de entrada da sua casa, que é a linha principal de abastecimento, e nos pontos de uso, como pias e chuveiros da cozinha e do banheiro. Sempre use água filtrada para beber, cozinhar ou preparar fórmulas infantis.

• Evite objetos domésticos que contêm chumbo: brinquedos infantis, cosméticos e cerâmicas são alguns itens que podem conter chumbo. Para mais informações sobre produtos que contêm chumbo e avisos de recall, consulte o site da Comissão de Segurança de Produtos de Consumo.

• Faça o teste dos níveis de chumbo no seu sangue e no de seus filhos: se você mora em uma casa antiga, teste seus filhos aos 1 e 2 anos de idade, e de novo aos 3 e 4 anos. Também é recomendável realizar o teste sempre que houver suspeita de exposição. Se você tem doença cardíaca, certifique-se de realizar esse teste. Um nível de 3,5 mcg/dL ou mais é considerado um fator de risco.

Se você apresentar níveis elevados, precisará eliminá-lo do corpo com cuidado para evitar danos adicionais durante o processo. Uma estratégia é usar N-acetilcisteína (NAC), um precursor da glutationa que auxilia na desintoxicação.