Não conta para ninguém, tá? Essa notícia fica só entre nós: a fofoca tem um papel importante na evolução dos seres humanos. Pelo menos é isso que sugere um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Stanford e da Universidade de Maryland, nos EUA. Segundo os autores, fofocar tem um papel importante de comunicar informações sigilosas para garantir relações de confiança.
O ser humano passa, em média, 52 minutos por dia fofocando, segundo uma pesquisa de 2019 que gravou todas as conversas diárias de centenas de participantes. Os estudiosos definiram “fofoca” como qualquer troca de informação pessoal sobre pessoas ausentes da conversa – ou seja, elogiar alguém pelas costas também conta.
A nova pesquisa mostra que a prática ajuda a fortalecer laços e criar confiança entre humanos – a fofoca é importante exatamente porque te mostra em quem você pode confiar. No entanto, é necessário fazer uma diferenciação que o estudo também faz: a fofoca só é benéfica se as informações são confiáveis. Espalhar mentiras e boatos não aumenta a cooperação interpessoal, e pode inclusive abalar os laços de confiança.
O estudo, com o título “Explicando a evolução da fofoca”, foi publicado no periódico científico PNAS.
Fofoca nos deixa menos egoístas?
A teoria de “ciclo evolutivo da fofoca” dos pesquisadores foi testada em um modelo de computador. No programa, robôs fofoqueiros virtuais interagiam uns com os outros baseados em várias estratégias, e tinham que lidar com as consequências dessas interações.
Os fofoqueiros gerados por computador iam se sofisticando, aprendendo quais eram as melhores estratégias de cooperação e fofoca, com mais benefícios no final. 90% dos agentes virtuais escolheu fofocar, já que a prática possibilitava um nível alto de cooperação e criava relações de confiança entre os interlocutores.
Um dos principais achados dos pesquisadores é que a fofoca é eficaz em espalhar informações sobre as reputações das pessoas, e esse ciclo leva as pessoas a se preocuparem mais com a própria reputação e comportamento. Essas informações também são essenciais para as pessoas decidirem com quem vão se afiliar (e de quem vão querer escapar).
Outra atividade positiva que, segundo o estudo, a fofoca pode causar, é uma melhora de comportamento nas pessoas que querem evitar ser o tema do papo dos fofoqueiros. Os indivíduos passaram a agir de maneiras menos egoístas – especialmente quando estavam com pessoas que sabiam que eram fofoqueiras, e que, portanto, ganhavam uma vantagem evolutiva por interagirem com pessoas mais altruístas (mesmo que de forma oportunista).
Tudo isso pode parecer contrário ao senso comum, de que a fofoca é ruim para a cooperação e fere a coesão social dos grupos. Isso não deixa de ser verdade. O estudo percebeu que a fofoca só servia a uma função evolutiva positiva se fosse baseada em informações confiáveis.
O modelo computacional usado é simples, só considerando agentes que sempre fofocam e pessoas que sempre mantém a boca fechada, e trabalhando com a suposição de que as pessoas são igualmente afetadas por fofocas positivas e negativas – o que não é verdade na vida real. Não houve meio-termo, então estudos futuros precisam fazer análises mais complexas para entender melhor o papel da fofoca na evolução.
Dados empíricos coletados no mundo real, e não numa simulação de computador, são o próximo passo para a ciência da fofoca. Mas aí a ciência começa a ficar complicada: uma simulação computacional consegue analisar várias gerações e perceber mudanças evolutivas, algo praticamente impossível para um estudo com pessoas de carne e osso.
Fonte: abril