Vantablack é o nome do pigmento mais escuro do mundo. Feito com nanotubos de carbono, esse material absorve 99,965% da luz incidente. Olhar para um cubo pintado com essa substância é como observar aquelas cenas do Looney Tunes em que um personagem conjura um buraco na paisagem só para o outro cair.
Na natureza, alguns pretos são mais escuros que outros. O pretinho mais básico é o dos corvos, por exemplo. A coloração extrema das penas desses animais é resultado da presença de melanina, o mesmo pigmento que dá cor a nossos cabelos. Ou seja: é preto, mas não tão preto.
Aí entram os animais super-pretos, que, diga-se de passagem, são também super-raros. Para obter esses tons, não basta pigmento. São necessárias microestruturas com outros recursos físicos para dar fim na luz que atinge o animal.
Alguns super-pretos exemplares são as aranhas-pavão, as aves-do-paraíso, as víboras-do-gabão, alguns peixes e as borboletas sapateiro-grego.
Um membro ilustre dessa lista são as formigas-feiticeiras, ou formigas-veludo (Traumatomutilla bifurca). Originárias da caatinga brasileira, essas formigas, na verdade, não tem nada de formigas.
Apesar do nome, os insetos são vespas sem asas – daí o nome da família Mutillidae, as vespas mutiladas. Outra característica única da éspecie é sua a aparência exterior felpuda.
Esse grupo é encontrado no mundo inteiro: nos Estados Unidos, elas são conhecidas como “matadoras de vacas” (cow-killers) e possuem um tom avermelhado. O que torna os exemplares brasileiros especiais, porém, é o preto.
Vinicius Lopez, entomologista da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, se especializou em coloração de insetos e, junto a uma equipe de cientistas, descobriu que as partes pretas desses bichinhos fêmeas eram, na verdade, super-pretas. O estudo foi publicado no Beilstein Journal of Nanotechnology.
Ele contou ao New York Times que talvez seja por sua habilidade de desaparecer facilmente (graças a coloração) que as Traumatomutilla bifurca ganharam o nome popular e místico de “feiticeiras”.
A descoberta marca o primeiro registro de coloração super-preta em um inseto do grupo das vespas, formigas e abelhas (a ordem Hymenoptera). Além disso, os pesquisadores apontam que o tom das brasileiras é mais escuro do que o encontrado em outros animais super-pretos.
Esse tipo de pigmentação ajuda os animais em diversos aspectos, como a regulação da temperatura do corpo, camuflagem contra predadores e atração de parceiros. Lopez e sua equipe estavam investigando os mecanismos de produção de cor em insetos quando descobriram que a formiga-veludo possui um revestimento único.
Sob uma camada densa de estruturas similares a pelos, o exoesqueleto do inseto apresenta plaquetas empilhadas de forma intricada, num padrão nunca antes visto em outros animais de coloração escura.
Os pesquisadores acreditam que essa disposição seja crucial para produzir a cor ultra-preta e opaca do inseto, pois a luz é facilmente absorvida e fica “presa” nas camadas de quitina da vespa.
As fêmeas também absorvem quase toda a luz ultravioleta. A teoria dos autores é que isso pode ser uma estratégia de defesa contra predadores que conseguem enxergar ondas eletromagnéticas invisíveis para nós, meros mortais.
Ainda restam dúvidas, porém. Qual o motivo do super-preto aparecer somente nas fêmeas, por exemplo? Os pesquisadores pretendem continuar na análise do tema.
Por ora, podemos ficar felizes pela sempre surpreendente biodiversidade das terras brasileiras – e vale a recomendação: melhor olhar bem por onde pisa, pois a picada das bichinhas é braba.
Fonte: abril