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Ciência & Saúde

Areia radioativa do Saara: origem nos testes nucleares da Guerra Fria

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Na década de 1960, a França conduziu testes nucleares atmosféricos – que ocorrem acima da superfície e, portanto, são mais perigosos para a saúde humana que os testes subterrâneos ou subaquáticos – na região de Reggane, no sul da Algéria. Essa área do país, que foi colônia francesa até 1962, é ocupada pelo Saara, o maior deserto quente do mundo.

Uma equipe de cientistas que trabalham na Europa, liderada por Yangjunjie Xu, do Laboratório das Ciências do Clima e do Meio Ambiente da França, quis avaliar o nível de radioatividade da areia do Saara que chegou à Europa Ocidental depois de uma tempestade de poeira no deserto em março de 2022.

A preocupação dos pesquisadores era que a poeira que chegou à Europa fosse um risco de saúde para a população atual (como foi para os nativos argelinos décadas atrás).

Nas análises de amostras de areia, felizmente, eles concluriam que ela não oferece nenhum risco de saúde pública. Mas também descobriram algo surpreendente: que há sim uma pequena radioatividade no material, causada por testes dos EUA e da União Soviética que rolaram muito longe da África.

É isso que sugere o estudo publicado no periódico Science Advances, que argumenta que as bombas francesas produziam uma proporção de isótopos de plutônio diferente das armas mais potentes dos Estados Unidos e da União Soviética. A radiação encontrada na areia do Saara corresponde melhor à assinatura química deixada pelo testes dessas duas potências.

Sem riscos de saúde

Em março de 2022, houve uma tempestade de areia enorme no deserto do Saara. Por e-mail, Xu e seu colega Olivier Evrard explicaram à Super que a tempestade foi causada por uma combinação de anomalias meteorológicas, que vão ficar “mais e mais frequentes por causa das mudanças climáticas”.

Eles tentaram fazer esse estudo pela primeira vez em março de 2021, com outra tempestade de areia, mas não conseguiram coletar poeira suficiente para conduzir uma boa análise científica.

Em 2022, eles não só conseguiram coletar várias amostras, como mobilizaram a população pelas redes sociais para ajudar na coleta e propor um “experimento de ciência cidadã”. Pessoas da Alemanha, Bélgica, Espanha, França e Luxemburgo enviaram amostras de poeira desértica. Foram 110 amostras de areia da região do Reggane recebidas, e 53 estavam em estado bom o suficiente para serem usadas no estudo.

De acordo com os limites de radioatividade estabelecidos pela União Europeia, a areia que voou do Saara até o continente europeu não apresenta riscos de saúde expressivos. As tempestades de areia podem poluir o ar e piorar a saúde respiratória da população da Europa Ocidental, mas nada indica que a radioatividade seja uma ameaça à saúde pública.

Os limites de radiação da UE seguem uma recomendação internacional: o limite de exposição à radiação artificial por ano – de todas as fontes, de areia do deserto à comida – deve ser de 1 milisievert (mSv, unidade de medida usada para medir o impacto de radiação ionizada em seres humanos). No caso do estudo, eles mostraram que contato com a areia radioativa ficaria muito abaixo desse limite.

Radiação americana e soviética?

Os únicos testes nucleares registrados na área do Saara são da obra da França, todos eles na região da Argélia. Porém, os resultados da análise mostram que a radiação da areia do deserto não pode ter sido produzida por bombas francesas.

Enquanto os testes nucleares franceses produziam níveis de isótopos radioativos de plutônio menores que 0,07, os testes dos EUA e da URSS deixavam para trás um nível médio muito próximo do encontrado nas areias do Saara, de 0,187. As proporções de césio também corroboram o argumento, já que se assemelham aos níveis deixados pelas bombas americanas e soviéticas.

“As proporções de isótopos de plutônio dependem da composição da bomba, do poder das detonações e da condição da detonação”, explicam os cientistas envolvidos na pesquisa. As bombas de diferentes países têm diferentes composições e padrões de detonação, e por isso deixam assinaturas radioativas diferentes para trás.

Não há explicações definitivas para como a radiação das potências da Guerra Fria chegou até o Saara, mas uma detonação de bomba nuclear não tem um efeito só local. Esses testes atmosféricos liberam radiação na atmosfera compartilhada por toda a Terra, e os dois polos nucleares do mundo são os maiores responsáveis por essas liberações.

A União Soviética costumava realizar seus testes nucleares no Cazaquistão e no arquipélago de Novaya Zemlya, no norte da Rússia. No caso dos Estados Unidos, a maioria dos testes rolou no deserto do estado de Nevada ou nas Ilhas Marshall.

Os cientistas envolvidos pretendem continuar a pesquisar os vestígios de testes nucleares pelo hemisfério sul, “especialmente na América do Sul, incluindo o Brasil”. A América do Sul não foi palco de nenhum teste nuclear, mas explosões conduzidas nos oceanos Atlântico e Pacífico podem ter afetado a região, como aconteceu com o deserto do Saara.

O Projeto AVATAR, parceria entre pesquisadores da França e da Suíça, pretende examinar traços de isótopos radioativos de plutônio e césio na bacia do rio Uruguai, que fica dividida entre o país que dá nome ao rio, o Brasil e a Argentina, e na bacia do rio Catamayo, compartilhada entre Peru e Equador.

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Fonte: abril

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