Os rotíferos bdeloídeos são animais microscópicos que vivem em ambientes de água doce, espalhados pelo mundo todo. Esses bichos já existem há pelo menos 25 milhões de anos, perpetuando-se via reprodução assexuada. Mas não se deixe enganar pela aparência inofensiva e tamanho diminuto: eles são ladrões. Mais especificamente, de material genético.
“Roubar genes é o que chamamos de transferência de genes horizontal”, explica Chris Wilson, biólogo da Universidade de Oxford e o principal autor de um novo estudo, publicado na Nature Communications, que mostrou como os ladrõezinhos de água doce roubam genes de bactérias para desenvolver antibióticos complexos e se proteger de infecções.
A manobra de roubar genes é comum entre bactérias, que movem pequenos pedaços de DNA de uma célula para a outra. É assim, por exemplo, que bactérias que causam doenças formam resistência a antibióticos. Para seres vivos maiores que elas, é um pouco mais difícil de sair roubando genes. Mesmo assim, “isso definitivamente acontece, porque vemos vários genes em plantas e animais que claramente não deveriam estar ali”, segundo Chris.
Os rotíferos têm dez vezes mais genes roubados do que qualquer outro animal conhecido. Cientistas não têm certeza de como eles fazem isso, mas é inegável que eles possuem milhares de genes não-animais que provavelmente coletaram durante milhões de anos, talvez por meio das bactérias que ingeriram junto de comida.
Mas eles não são exatamente cleptomaníacos, com um desejo incontrolável de roubar genes aleatórios por prazer. Na verdade, esse material genético transferido ajuda os rotíferos a se destacar no jogo de sobrevivência da evolução.
“Nós não sabemos o que a maioria desses genes faz nos rotíferos, mas aqueles que eu e meus colegas analisamos parecem ajudá-los na vida cotidiana, com coisas como digerir comida, sobreviver na água quando o habitat deles seca ou se proteger da radiação do sol”, conta Chris.
Roubando a farmácia
Grande parte dos genes roubados estão sendo usados pelos rotíferos para se proteger de doenças. “Normalmente, um em cada dez genes nos rotíferos são roubados, mas quando falamos especificamente de genes que respondem a uma infecção, a proporção pula para um em cada quatro”. Dessa forma, a equipe chegou à conclusão de que os pequenos animais aquáticos estão roubando genes para se proteger.
Há 25 milhões de anos sobrevivendo por meio de reprodução assexuada (que não envolve troca de material entre indivíduos), todos os rotíferos são fêmeas. Por causa da perpetuação sem contato com outros genes, eles acabam correndo o risco de não diversificar o seu perfil genético. Essa falta de diversidade genética pode deixá-los mais vulneráveis a epidemias, já que são todos iguais e, portanto, igualmente suscetíveis a doenças. O jeito que encontraram de burlar isso foi roubando genes.
Esses genes roubados são modificados com o tempo, adaptados para melhor servir aos rotíferos. Um dos exemplos encontrados pelo estudo é o de receitas de antibióticos, que foram roubados de bactérias, mas atualizados para produzir novas combinações químicas nos rotíferos.
Fábrica de antibióticos naturais
Calma lá: esses bichinhos minúsculos produzem antibióticos? Pois é. Um antibiótico é qualquer substância capaz de eliminar ou impedir a reprodução de bactérias. A maioria deles não foram inventados por cientistas em laboratório, e sim por seres vivos como fungos e bactérias. Eles são produzidos por enzimas grandes e especiais chamadas sintases.
Os rotíferos têm as mesmas enzimas que as bactérias e os fungos, roubadas de bactérias e usadas para produzir antibióticos que combatem infecções de fungos. Ou seja, estão usando o feitiço contra o feiticeiro. Olha só um rotífero sendo atacado por um fungo:
“Nós só olhamos para o DNA de duas espécies de rotíferos, mas encontramos dúzias de receitas de antibióticos diferentes”, explica Chris. Há mais centenas de rotíferos na natureza que tiveram milhões de anos para juntar um belo livro de receitas de antibióticos. Pode haver um baú do tesouro de novas moléculas que nem imaginávamos que existiam nesses trombadinhas.
A descoberta dessa capacidade dos rotíferos também é empolgante porque a maioria dos antibióticos naturais são venenosos para células animais. “Só alguns podem ser usados como tratamentos médicos, e é difícil e caro descobrir quais deles são seguros.”
Já que os próprios animais estão adaptando e criando seus antibióticos, pode ser que esses remédios naturais dos rotíferos sejam mais seguros para outros animais, como os seres humanos. “Nós acreditamos que os rotíferos podem já ter feito um pouco do trabalho duro de pesquisa, teste e adaptação de antibióticos”, comenta Chris. Esses pequenos animais podem ser o Robin Hood da natureza, roubando por um bem maior.
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Fonte: abril