Não é de hoje que os pais ajudam com a lição de casa e garantem que seus filhos cumpram responsabilidades como algumas tarefas domésticas, mas o tempo prolongado e muitas vezes desorganizado que os familiares têm passado juntos durante a crise atual cria novos desafios.
Em meio a uma situação de crise, estabelecer uma estrutura é importante para manter a coesão e proporcionar uma sensação de segurança tanto para os pais quanto para os filhos. Isso inclui a criação de um cronograma e a comunicação de expectativas e diretrizes claras sobre tópicos como o tempo que os filhos podem passar diante das telas. Mas como os pais podem fazer com que os filhos sigam o cronograma e cumpram suas responsabilidades sem enchê-los de cobranças e de uma maneira que evite gritos e birras?
Eu sou psicóloga e trabalhei com pais em situações de desastres, estudando como eles poderiam diminuir conflitos na família e ajudar as crianças a se tornarem mais motivadas. Compartilho com vocês algumas estratégias para tornar a casa mais tranquila durante a crise do novo coronavírus.
Envolva as crianças na elaboração das regras
Quando as crianças participam da criação de diretrizes e cronogramas, é mais provável que elas os vejam como importantes, que os aceitem e os cumpram. Para envolver os filhos, os pais podem marcar uma reunião de família. Nessa conversa, os pais podem discutir o cronograma e pedir às crianças a sua opinião sobre que horas todos devem levantar, em que momentos os intervalos dos trabalhos escolares funcionariam melhor e onde cada membro da família deveria estar durante o tempo de estudo.
Nem toda ideia será acolhida – as crianças podem achar que se levantar ao meio-dia está ótimo. Porém, quando os pais ouvem as ideias de uma criança, isso a ajuda a se responsabilizar pelo seu comportamento e a se envolver mais com o que a família toda está fazendo.
Pode haver diferenças de opinião. Os pais podem negociar com as crianças para que pelo menos algumas das ideias delas sejam adotadas. A resolução de conflitos é uma habilidade importante a ser ensinada às crianças – e a melhor forma de elas aprenderem isso é com seus pais.
Dê espaço para a liberdade de escolha
As tarefas da escola devem ser realizadas e os afazeres domésticos precisam ser concluídos, mas ter alguma abertura para decidir como essas responsabilidades serão realizadas pode ajudar os filhos a se sentirem menos pressionados e coagidos – o que prejudicaria sua motivação.
Os pais podem apresentar algumas tarefas domésticas e pedir que os filhos escolham quais delas preferem realizar. Eles também podem escolher quando ou como realizá-las – por exemplo, se querem lavar a louça antes ou depois de assistir à televisão. Os pais também podem deixar com as crianças a escolha de qual atividade de lazer elas gostariam de fazer no final do dia ou em uma pausa nos estudos.
Ouça e seja empático
As crianças estarão mais abertas a dar atenção às orientações dos pais se sentirem que suas próprias perspectivas são entendidas. Os pais podem dizer aos filhos que entendem, por exemplo, que não é divertido estar em casa e que também sentem falta de estar com os amigos.
Os pais podem iniciar os pedidos que fazem aos filhos com uma declaração de empatia – por exemplo: “Eu sei que parece que tirar o pijama é bobagem porque estamos em casa. Mas trocar de roupa faz parte da rotina que todos nós decidimos”. Mesmo que os pais não concordem com a perspectiva de seus filhos, a cooperação e a relação entre pais e filhos é aprimorada quando eles demonstram que pelo menos a entendem.
Explique os motivos das regras
Quando os pais apresentam as razões para pedir algo, os filhos entendem melhor a importância de agir de maneiras específicas. Os motivos serão mais eficazes quanto mais forem significativos para as crianças em relação aos seus próprios objetivos. Por exemplo, os pais podem dizer que dividir as tarefas da família ajudará todos a ter mais tempo para as atividades de recreação depois do jantar.
Peça a contribuição delas na resolução de problemas
Nem tudo correrá conforme o planejado – haverá momentos de frustração, cobrança e reclamações. Quando as coisas não estão dando certo, os pais podem tentar resolver os problemas em conjunto com os filhos, o que significa aplicar empatia, identificar o problema e encontrar maneiras de resolvê-lo.
Por exemplo, um pai ou mãe pode dizer: “Eu sei que tenho cobrado demais você acordar de manhã. Deve ser mesmo muito irritante ouvir uma cobrança como a primeira coisa ao acordar. O problema é que, embora tenhamos todos decidido que acordaríamos às 8 horas, você não sai da cama. Vamos pensar juntos o que podemos fazer para tornar a manhã mais tranquila. Quais são as suas ideias?”
Testemunhei como essa tática alivia o estresse da manhã no caso de pais que trabalham e precisam levar seus filhos para a escola antes de irem para o trabalho, e acredito que isso também poderia ajudar durante a pandemia.
Todas essas práticas podem ajudar as crianças a sentirem mais no controle de seu comportamento. Isso as tornará mais propensas a cooperar. No entanto, essas estratégias exigem tempo e paciência – algo que é difícil de encontrar em momentos de estresse. Pesquisas mostram que os pais têm maior probabilidade de gritar, exigir e ameaçar quando estão com pressa, estressados ou preocupados com o desempenho de seus filhos. É por isso que é importante que os pais encontrem tempo para cuidar de si mesmos – seja passeando, se exercitando, meditando ou escrevendo em um diário. Uma pandemia como essa apresenta desafios para os pais, mas o uso de estratégias motivacionais pode ajudá-los a criar um ambiente mais calmo e efetivo – o que também facilita um relacionamento positivo entre pais e filhos.
*Professora de Psicologia na Clark University, nos Estados Unidos.
©2020 The Conversation. Publicado com permissão. Original em inglês.
Fonte: semprefamilia.com.br