No comparativo com as últimas eleições gerais do Brasil, realizadas em 2018, o pleito deste ano marca o crescimento de 10% na quantidade de candidatos que declararam ter como ocupação atividades vinculadas à agropecuária. Levantamento feito pelo Canal Rural junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que 696 profissionais ligados ao agro pediram registros de candidaturas. Há quatro anos, o número foi de 633.
Com exceção aos postos de vice-presidente e presidente da República, todos os demais cargos em disputa no dia 2 de outubro contam com candidatos oriundos do agronegócio. São cinco governadores que, por exemplo, declararam à Justiça Eleitoral terem como profissão funções inseridas no setor. Há sete candidatos a deputado distrital — mesmo número de 1º suplente. Em termos crescentes, a lista continua com 2º suplente (oito), vice-governador (10) e senador (10).
O destaque na relação de profissionais da agropecuária com as eleições 2022 se dá, porém, entre deputados. Isso porque 226 almejam ter vez na Câmara dos Deputados no decorrer dos próximos anos. A disputa nas assembleias legislativas é ainda maior: são 423 candidatos ligados ao agro espalhados pelos 26 estados brasileiros.
Setor abre os olhos para o Legislativo
O aumento geral de candidatos e, principalmente, o alto volume de profissionais do setor na briga na parte de deputados mostra que o agro “acordou” para a política partidária. É o que avalia, por exemplo, o doutor em desenvolvimento agrário Jorge Nogueira. Para ele, que é professor titular do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), o setor percebeu a necessidade de se fazer presente para além do poder Executivo.
“Ou começava a ter voz ativa na política (…) ou iria sempre levar ‘chinelada’” — Jorge Nogueira
“Nos últimos 30 anos, o setor do agronegócio percebeu que ou começava a ter voz ativa na política — tendo pessoas representando os interesses nas decisões não apenas do Executivo, mas em particular no Legislativo — ou iria sempre levar ‘chinelada’ de todos os lados”, avalia Nogueira, em entrevista ao Canal Rural. “Agora, vai continuar a buscar ter representação crescente junto àqueles que formulam políticas públicas”, prossegue o acadêmico.
O pensamento do doutor em desenvolvimento agrário converge com a análise de Leandro Consentino, doutor em ciência política e professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), em relação à presença de profissionais do agro nas eleições 2022. De acordo com ele, a movimentação mostra que a área está, no geral, se organizando em termos políticos — como já ocorre há tempos em outros setores do país.
Quebrando os estereótipos do agro
Outro ponto abordado por Consentino é de que o pleito deste ano reforça que a agropecuária tem trabalhado para quebrar os estereótipos que por tempos perduraram junto ao imaginário da população em geral, de que o produtor rural seria, em suma, um “caipira” que não se importava com mais nada que não fosse relativo à sua propriedade rural. “Fruto de campanha de conscientização da importância do agronegócio na sociedade brasileira”, observa o professor.
“Ausência da vergonha, que se tinha antigamente, em se dizer parte do mundo rural” — Leandro Consentino
Nesse sentido, o cientista político afirma que o aumento de candidaturas de profissionais do agro pode ter a ver com a quebra de certo tipo de preconceito. “Ausência da vergonha, que se tinha antigamente, em se dizer parte do mundo rural, seja pelo preconceito de quem estava na sociedade urbana de ver o rural como algo atrasado, seja pela imagem de violência no campo”, diz Consentino. “Estamos nos admitindo como parte do agronegócio, de algo que dá certo”, comenta.
Pesquisador do desenvolvimento agrário há décadas, Nogueira destaca, sobretudo, que a quebra de estereótipos vai para além do perfil de quem vive no campo. Para ele, as candidaturas mostram que o homem do campo vai “além da porteira”. “Começamos a ver que a agropecuária tem influência para trás, nos setores de onde ela compra insumos, e tem influência para frente, para os quais ela vende a produção”, afirma o professor da UnB.
Esquerda X direita? Há candidatos dos dois lados
O que na visão dos dois professores universitários também indica a quebra de estereótipos do agronegócio é a pulverização das candidaturas de profissionais do setor por mais de 30 partidos, dos mais diversos espectros ideológicos. O PL, do presidente Jair Bolsonaro, lidera a lista com 61 representantes da agropecuária entre os pedidos de registros de candidaturas. Na segunda posição, entretanto, aparece uma sigla de esquerda: o PT. A legenda do ex-presidente Lula conta com 48 profissionais do agro na disputa eleitoral.
“Você tem desde os interesses do trabalhador rural, você tem os interesses dos chamados ‘sem terra’…” — Jorge Nogueira
“Não me surpreende nenhum pouco que tanto o PT quanto o PL, apesar de estarem em lados ideológicos completamente distantes, estejam percebendo a importância do setor”, comenta Jorge Nogueira. “Os interesses da agropecuária como um todo são muito diversos. Você tem desde os interesses do trabalhador rural, você tem os interesses dos chamados ‘sem terra’, você tem os interesses da pequena agricultura familiar, tem o interesse da pequena agricultura comercial, da grande agricultura e etc.”, explica o pesquisador.
Para Leandro Consentino, essa divisão entre partidos na questão de candidatos vinculados ao agro é “muito importante”. “É preciso que ele esteja disseminado em diversas forças políticas para que não seja identificado como só de um lado”, declara o doutor em ciência política. “Nesse momento de polarização, o agro precisa estar além disso. Ele é patrimônio do Brasil e não do partido A ou B”, pontua o professor do Insper que, contudo, demonstrou surpresa com o avanço da esquerda entre candidaturas vinculadas à agropecuária.
Entre direita, esquerda e centro, as candidaturas entre profissionais com ocupações ligadas à agropecuária está dividida da seguinte forma entre 31 partidos políticos:
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Candidatos da agropecuária por UF
A pulverização de candidatos do agro não fica restrita aos partidos. Nesse sentido, todas as 27 unidades federativas do país contam com representantes do setor na disputa do pleito deste ano. Maior produtor de café e leite no Brasil, Minas Gerais aparece na primeira posição, com 51 candidatos. O pódio é formado, ainda, pelo Pará (49) e um estado que está fora do top 10 de volume bruto da produção agropecuária (VBP): Rondônia, que tem 48 candidatos ligados à agropecuária.
O fato de Rondônia — que não aparece na lista de maiores produtores agropecuários e é, além disso, o quinto estado menos populoso do país, com pouco mais de 1,8 milhão de habitantes, segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) — figurar nas primeiras posições no quesito candidaturas do agro é positivo, aponta Consentino. Ele pontua, por exemplo, que isso é mais um indicador que ajuda a combater o estereótipo do setor.
“Tem a ver com as novas fronteiras agrícolas que o Brasil vem observando” — Leandro Consentino
“O que dá para enaltecer é a boa notícia de que o agro está se disseminando”, declara o professor do Insper. “A percepção virtuosa do agro estar começando a se assumir não está restrita aos grandes centros produtores. E também tem a ver com as novas fronteiras agrícolas que o Brasil vem observando. O agro está no Pará, está em Rondônia, em diversas culturas, e é importante ele estar representado [na política]”, complementa o cientista político ouvido pelo Canal Rural.
Com Rondônia na terceira posição, a relação de candidatos do agro por unidade federativa é a seguinte:
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As ocupações do agro nas eleições 2022
Mas, afinal, quem são os candidatos que podem ser classificados como representantes de núcleos da agropecuária brasileira nas eleições deste ano? Com base na autodeclaração profissional que obrigatoriamente é feita à Justiça Eleitoral na hora de se protocolar o pedido de candidatura, a reportagem do Canal Rural mapeou dez diferentes ocupações — que vão de agricultores a pecuaristas, passando por zootecnistas e agrônomos — com representantes na disputa.
Na relação de profissionais do agro e cargos em disputa, a divisão nas eleições 2022 é a seguinte:
- Agricultor = 289
Deputado federal = 77
Deputado estadual = 197
Deputado distrital = 1
Senador = 1
1º suplente = 3
2º suplente = 3
Governador = 2
Vice-governador = 5
- Produtor Agropecuário = 104
Deputado federal = 36
Deputado estadual = 56
Deputado distrital = 5
1º suplente = 2
2º suplente = 1
Governador = 1
Vice-governador = 3
- Motorista de Veículos de Transporte de Carga = 75
Deputado federal = 29
Deputado estadual = 46
- Pecuarista = 66
Deputado federal = 24
Deputado estadual = 38
Senador = 1
1º suplente = 2
2º suplente = 1
- Veterinário = 57
Deputado federal = 20
Deputado estadual = 29
Deputado distrital = 1
Senador = 4
2º suplente = 1
Governador = 1
Vice-governador = 1
- Agrônomo = 36
Deputado federal = 12
Deputado estadual = 19
Senador = 2
2º suplente = 1
Governador = 1
Vice-governador = 1
- Pescador = 25
Deputado federal = 11
Deputado estadual = 14
- Trabalhador Rural = 24
Deputado federal = 11
Deputado estadual = 11
Senador = 1
2º suplente = 1
- Técnico em Agronomia e Agrimensura = 16
Deputado federal = 4
Deputado estadual = 12
- Zootecnista = 4
Deputado federal = 2
Deputado estadual = 1
Senador = 1
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